Uma sessão organizada pelo Instituto de Historia da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Realizou-se no dia 1 de Março, dia em que a Universidade celebrava o seu 723.º aniversário.
A sala destinada para este evento foi pequena para tantos
participantes que se viram encaminhados para o Teatro Paulo Quintela.
Os oradores foram Jorge Custódio, que do seu imenso currículo
destaco a passagem pelo Museu Ferroviário, pelo Mosteiro de Alcobaça e o trabalho
incrível como comissário da exposição 100 anos de Património – Memória e
Identidade e Ana Paula Amendoeira doutoranda em Paris, investigadora do Centro de
Estudo Arqueológicos da Universidade de Coimbra e do Porto e, por fim, presidente
do ICOMOS.
A apresentação de Jorge Custódio intitulou-se «Etapas da
História do Património em Portugal». Destaco algumas frases provocativas do
historiador quando referia a importância dos historiadores e do estudo da
história e como esta é transversal a todas as áreas, ensinos e setores sociais:
«não somos nós um veículo no nosso ADN?», «somos passado, presente e futuro» e
ainda nós «somos portadores de cultura».
Referiu as diferentes atitudes face ao património que passaram
pelo vandalismo até à salvaguarda ou mesmo à preservação. Referiu as questões
de datação que apesar de flexíveis no tempo são influenciadas por questões
políticas e sociais adjacentes.
Como base para o seu estudo e trabalho para a exposição dos
100 anos de Património Jorge Custódio identificou 12 elementos que ajudam a
circunscrever as questões patrimoniais:
1.
herança
2.
condições históricas
3.
estado base das atitudes
4.
sistema de proteção vigente
5.
conjuntura patrimonial internacional
6.
consciência patrimonial
7.
sistema de valores
8.
instituições especializadas
9.
instrumentos de proteção
10.
instrumentos de salvaguarda
11.
instrumentos de gestão
12.
transmissão
Apesar das questões do património serem um motivo para comparações
ao nível europeu, apesar da equivalência das etapas do património com questões
politicas e apesar de toda a organização e máquina montada em prol do património
Jorge Custódio conclui: «Ainda há desnorte!».
A apresentação de Ana Paula Amendoeira intitulou-se «Do Património
ao Património Mundial: um percurso geopolítico para um conceito de dominação».
Esta apresentação resultou de uma investigação que se encontra a desenvolver
atualmente, na qual teve a oportunidade de contactar com documentação inédita e
que pode vir a mudar a visão do património, das suas definições e da sua
origem.
O conceito de Património da ONU e da UNESCO foi, na sua
origem, demasiado simplista uma vez que o objetivo passava por instalar e
garantir a paz cultural. No que defende Ana Paula Amendoeira o conceito de
desenvolvimento cultural foi inserido pelos EUA e foi a ideia subjacente a determinados
discursos políticos que contribuiu para o desenvolvimento do património tal
como hoje é conhecido.
O presidente H. Turman, em 1979, diz num discurso que era
preciso cuidar dos países que saiam do colonialismo. Cuidar desses países
passava por desenvolver os mesmos para que se pudessem equiparar a países
desenvolvidos. O conceito de «Património Mundial» é uma invenção americana,
encontrada nos textos de discurso produzidos pelos presidentes Nixon e Johnson.
A oradora defende que os dados com que tem vindo a
contactar, documentos inéditos do arquivo do conselho de Washington, datados de
1967, revelam que a Unesco não foi a responsável pela origem do termo
Património Mundial, mas por outro, repescou o termo dos discursos americanos.
Discursos estes que teorizavam as noções de património mundial, como tendo na
sua origem o apoio ao desenvolvimento de países novos, que se viam sem os
colonizadores.
Nos anos 80, a UNESCO tinha efetivamente a intenção de criar
uma «Cruz Vermelha do Património em Perigo» uma organização de apoio e
salvaguarda de equipamentos vítimas de inundações e outros flagelos naturais.
Este projeto da Unesco e do ICOMOS teve discussão prévia com representantes
americanos que fizeram vencer o termo «Património Mundial».
A classificação de um local a Património Mundial é outra
questão com influências politica muito demarcadas. A influência americana foi
abalada com a entrada da Palestina na UNESCO, uma entrada que os Estados Unidos
tentaram travar.
E nisto a discussão que tinha deixado parte da assistência em
choque e ainda a digerir toda a informação nova, em primeira mão, muda ligeiramente
e inicia-se o debate relativo à classificação de determinados locais pela
Unesco. Também a Universidade de Coimbra se encontra com um processo de candidatura
da Universidade a Património Mundial, mas outros locais simplesmente não
pretendem esse título, apesar de todas as características que reúnem, pelo
simples facto de não pretenderem perder aquilo e o que os faz serem diferentes.
É do conhecimento geral que os locais classificados pela
Unesco registam um forte aumento ao nível turístico, um crescimento de receitas,
aumento dos investimentos hoteleiros entre outros. Este foi o mote deixado no ar e que impulsionou o debate com a assistência.
Do debate reiteramos algumas opiniões:
Ana Paula Amendoeira dizia «há um conflito entre a Unesco
que prima pela visão turística e das receitas que confronta com o ICOMOS que
prima pelo valor da conservação e da salvaguarda»
O responsável pela candidatura da Universidade o Doutor
Raimundo Mendes da Silva reforçava que o importante com estas candidaturas era
o que se poderá fazer com eles e os efeitos colaterais.
Jorge Custódio propôs alguma cautela quando se refere a origem
do termo património mundial. Sugerindo mesmo uma maturação da ideia, contudo
concordou que o património é consensual e pode, por isso, ser aproveitado
politicamente.
Termino esta espécie de relato, defendendo a casa que me
formou e me ajudou a crescer. Sublinhando palavras da Prof. Doutora Luísa
Trindade adotadas pelo presidente da Faculdade de Letras Prof. Doutor Carlos Ascensão
André «A história da Arte ainda mexe!».
Fonte das imagens, por ordem de apresentação das mesmas:
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